Simulações para análise do impacto da retomada de atividades presenciais de ensino na UFSC

Feres Azevedo Salem, Ubirajara Franco Moreno (UFSC)

Pós-Graduação em Engenharia de Automação e Sistemas, CTC/UFSC

25/06/2020

Apresentação

Os desdobramentos da retomada das atividades na UFSC no quadro da pandemia COVID-19, traz impacto direto para uma comunidade de cerca de 50 mil integrantes e tem um potencial efeito em toda a comunidade da cidade de Florianópolis. O objetivo deste trabalho é fornecer a gestores e tomadores de decisão, o resultado de simulações em larga escala para a análise de cenários de disseminação de vírus. Estas simulações são baseadas em modelos epidemiológicos e de comportamento social, permitindo modelar cada indivíduo de uma população, considerando fatores de risco, padrões de interação com outros indivíduos, taxa de contágio e recuperação. Nos cenários avaliados, é possível realizar um acompanhamento diário da evolução de regimes epidêmicos e elaborar estatísticas da evolução destes quadros. Os modelos implementados acompanham o estado da arte em modelos de expansão virais e incorporam os modelos mais recentes que consideram as últimas pesquisas acerca dos modelos referentes ao COVID-19. Considerou-se como cenário, um prédio de grande porte de salas de aula UFSC, e analisou-se o efeito da limitação do número de alunos por sala e o número de interações sociais no espaço de sala de aula e nas áreas comuns e de circulação das edificações. Na sequência é apresentada uma breve descrição do modelo de simulação, os resultados obtidos nas simulações e possíveis conclusões.

Modelo e Resultados de Simulação

O modelo utilizado para as simulações é baseado em uma representação de relações sociais entre indivíduos (), e um quadro de evolução do estado destes agentes em função de possiveis contágios.

Para explicar a formulação do modelo de simulação, optou-se por dividi-lo em duas partes: o modelo dos agentes, que define como cada pessoa se comporta “internamente”, como elas passam de um estado para outro; e o modelo da rede, o qual indica quais são as possíveis interações entre os diferentes agentes na simulação. A seguir serão dados mais detalhes para ambos os componentes do modelo.

A Figura 1 ilustra a evolução de estados, escolhida para representar os agentes na presente análise. Estes estados são equivalentes aos compartimentos considerados em modelos epidemiológicos amplamente usados na literatura (modelos SEIR)

Figura 1. Estados dos indivíduos, sendo: S - Suscetível; E - Exposto; I - Infectado; R - Removido

Figura 1. Estados dos indivíduos, sendo: S - Suscetível; E - Exposto; I - Infectado; R - Removido

  • [S] Suscetível: Pessoa que nunca foi infectada pelo vírus e, portanto, pode passar para o estado Exposto ao entrar em contato com um Infectado;
  • [E] Exposto: Pessoa que teve contato com um Infectado e contraiu o vírus, porém ainda não possui carga viral o suficiente para transmitir para outras pessoas;
  • [I] Infectado: Pessoa que contraiu o vírus já há algum tempo e, caso ocorra um contato, é capaz de infectar Suscetíveis;
  • [R] Removido: Pessoa que entrou em quarentena após apresentar sintomas o que contraiu o vírus e já passou do período em que poderia infectar outras pessoas

As transições entre os estados da Figura 1 ocorrem a partir de eventos aleatórios seguindo padrões estatísticos da COVID-19, extraídos de bases de dados nacionais e internacionais.

O contágio, a transição de um agente de [S] para [E], ocorre quando o agente em [S], suscetivel, interage aleatoriamente com outro que esteja no estado [I], infectado, e seguindo uma distribuição de probabilidade é exposto ao vírus. Esta probalidade depende das medidas de precaução adotadas pelos agentes, nas simulações realizadas considerou-se um grupo majoritário que segue as recomendações de proteção e um grupo minoritário, designado como relapso, que não segue adequadamente as recomendações.

As outras duas transições, de [E] para [I] e de [I] para [R], ocorrem a partir do número de dias de cada transição. Isso é, existe uma probabilidade da transição ocorrer em um dado dia, a contar do dia de entrada no estado atual. As Figuras 2 e 3 ilustram essas probabilidades.

Figura 2. Probabilidades de transição de exposto (E) para infectado (I) em função do número de dias desde a transição a partir do estado suscetível (S)

Figura 2. Probabilidades de transição de exposto (E) para infectado (I) em função do número de dias desde a transição a partir do estado suscetível (S)

Figura 3. Probabilidades de transição de infectado (I) para removido (R) em função do número de dias desde a transição a partir do estado exposto (E)

Figura 3. Probabilidades de transição de infectado (I) para removido (R) em função do número de dias desde a transição a partir do estado exposto (E)

Para o modelo de interação social foi considerado um único prédio da UFSC, sendo composto por 52 salas de aula, havendo uma rede de contatos internos para cada sala de aula representado na figura 4, e uma rede de contatos correspondente aos espaços comuns e de circulação, representada na figura 5. Nas simulações variou-se a ocupação das salas e o número de possíveis interações socias diárias.

Figura 4. Grafo representando os clusters (salas de aula) isolados uns dos outros

Figura 4. Grafo representando os clusters (salas de aula) isolados uns dos outros

Figura 5. Exemplo de grafo representando interações aleatórias entre todos os nós

Figura 5. Exemplo de grafo representando interações aleatórias entre todos os nós

Cenários Simulados e Resultados

Foram considerados três cenários diferentes para as simulações. Em todos eles foi definido que a probailidade de contágio na interação entre um agente no estado [S] e outra no estado [I]) é de 0.03 (3%) e de 0.15 (15%) no caso de uma agente pertencer ao grupo designado como relapso, sendo que este grupo representa 5% da população total. E o número de indivíduos inicialmente no estado [I], ou seja, em codição de contagiar outros indivíduos, corresponde a 0,5% da população total. Durante o intervalo de simulação não foram considerados novos contágios externos e considerou-se tabém um cenário otimista quanto à cpacidade de detecção e isolamento de alunos sintomáticos. Não foi considerado também um comportamento específico para os docentes em sala. Nas simulações foi avaliada a influência da ocupação das salas de aulas e a correspondente dimunuição do número de interações sociais.O nome utilizado para representar cada cenário indica o valor escolhido o número de alunos por sala, o número de interações diárias dentro da sala e o número de interações diárias nos espaçõs comuns e de circulação. Estes cenários são designados como: ; e . Todas simulações foram realizadas para um horizonte de 30 dias e para cada cenário foram executadas 100 simulações.Um vídeo ilustrativo está disponível em sim_covid_ufsc.

Como mencionado anteriormente, foram executadas 100 simulações para cada cenário. Todas as simulações tiveram duração de 30 dias, sendo que o dado referente ao 31\(^{o}\) dia é apresentado para indicar a situação ao final do 30\(^{o}\). Isso é mesmo que dizer que o estado final em um dia é o estado inicial do dia seguinte.

Nas Figuras 6 e 7 mostram-se os resultados para o cenário 20-10-6, sendo que a Figura 6 representa-se os valores médios e desvio padrão para o conjunto de 100 simulações e na Figura 7 representa-se somente os valores médios normalizados em relação ao total da população, a soma das barras empilhadas representa o total acumulado de alunos que foram ou estão infectados a cada um dos 30 dias.

Figura 6. Média e desvio padrão da evolução da pandemia no cenário 20 alunos

Figura 6. Média e desvio padrão da evolução da pandemia no cenário 20 alunos

Figura 7. Gráfico de barras empilhadas da porcentagem média de pessoas que contraíram o vírus, para o cenário 20 alunos

Figura 7. Gráfico de barras empilhadas da porcentagem média de pessoas que contraíram o vírus, para o cenário 20 alunos

Nas Figuras 8 e 9 mostram-se os resultados para o cenário .

Figura 8. Média e desvio padrão da evolução da pandemia no cenário 15 alunos

Figura 8. Média e desvio padrão da evolução da pandemia no cenário 15 alunos

Figura 9. Gráfico de barras empilhadas da porcentagem média de pessoas que contraíram o vírus, para o cenário 15 alunos

Figura 9. Gráfico de barras empilhadas da porcentagem média de pessoas que contraíram o vírus, para o cenário 15 alunos

Nas Figuras 10 e 11 mostram-se os resultados para o cenário .

Figura 10. Média e desvio padrão da evolução da pandemia no cenário 10 alunos

Figura 10. Média e desvio padrão da evolução da pandemia no cenário 10 alunos

Figura 11. Gráfico de barras empilhadas da porcentagem média de pessoas que contraíram o vírus, para o cenário 10 alunos

Figura 11. Gráfico de barras empilhadas da porcentagem média de pessoas que contraíram o vírus, para o cenário 10 alunos

Conclusões

Mesmo considerando uma probabilidade de infecção baixa e um cenário otimista em relação à capacidade de detecção e remoçao dos casos sintomáticos, a retomada das atividades presenciais na UFSC pode levar a uma nova onda de infecções afetando a comunidade universitária tendo impacto na comunidade local. Todavia, as simulações indicam que uma restrição no número de alunos por sala pode ser efetivo na diminuição do contágio. Para um cenário com salas ocupadas por 20 alunos, cerca de 19% da população total ao final de 30 dias seria afetada. Sendo que salas com 10 alunos levaria a infecção de pouco mais de 8% do total de alunos. Vale lembrar que ambos os cenários partem de 0,5% de infectados.

Apesar dessa restrição impactar positivamente, ela não é suficiente para conter o espalhamento do vírus no campus de forma definitiva. Seria necessária alguma medida para diminuir o tempo em que as pessoas podem infectar outras (estado [I]). Mas uma testagem de todos os alunos, todos os dias, ou mesmo a cada 2 dias, é algo inviável.

Assim, verifica-se a existência de um elevado risco associado a uma possível retomada de forma segura, para atividades totalmente presenciais em um futuro próximo. A diminuição deste risco está associada à restrição do número de contatos, seja pela redução ocupação das salas e do tempo de permanência dos alunos na instituição. É importante ressaltar que neste estudo não é considerada a contaminação no deslocamento para a instituição, nem a interação com os modelos de propagação no cidade como um todo, o que seria um importante fator de agravamento.